O que dizem as estatísticas de crimes
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O que dizem as estatísticas de crimes


No século 19, Adolphe Quetelet ficou famoso ao aplicar métodos estatísticos e teoria da probabilidade em ciências sociais. Em um de seus primeiros estudos, ele analisou dados de crimes na França de 1826 a 1831 e verificou que as taxas eram mais ou menos constantes. Concluiu que, apesar de não sabermos quem vai ser morto nem como, era possível saber quantos homicídios de determinados tipos ocorreriam por ano no país. Segundo ele:
A própria sociedade contém os germes dos crimes cometidos. É o estado social, em alguma medida, que prepara esses crimes, e o criminoso é apenas o instrumento para executá-los.
Uma série temporal maior de análise de dados criminais nos permitem, hoje, verificar o "tributo de sangue" que a sociedade paga e quem o paga: jovens, pretos e pobres. A divulgação ontem do Mapa da Violência 2010: anatomia dos homicídios no Brasil ganhou destaques em portais como Estadão e Folha.

As matérias não trouxeram novidades (não li hoje as versões impressas). Acho que falta ainda uma postura mais crítica e um maior contexto no tratamento destes dados por parte da imprensa, não obstante, como já disse por aqui, a nítida evolução do jornalismo "policial".

Uma conclusão do estudo que virou notícia parece confirmar o determinismo de Quetelet: o índice de homicídios permanece quase inalterado de 1997 a 2007. Seria interessante aqui comparar com o aumento de investimentos e aparelhamento das forças de segurança nesse período. Tem alguma conta aí que não vai bater...

A pista pode estar na distribuição dos recursos, afinal, a segunda conclusão, derivada da primeira, é que houve aumento de crimes no interior e queda nas capitais, num fenômeno que os especialistas chamaram de "interiorização da violência". Daí o equilíbrio.

Isso pode parecer algo novo e alarmante, mas não é. Escuto essa explicação desde o final dos anos 1990, quando ainda estava na redação. Infelizmente, só achei uma referência disso num caderno especial que fizemos em 2003. Podem conferir que está lá: "interiorização da violência".

O perfil das vítimas também não apresentou qualquer novidade, com exceção, talvez, da distinção entre negros e brancos (mas o que isso quer dizer realmente?).

Problema do estudo? Não. Acho que a partir dele podem surgir boas reportagens, checando in loco a infraestrutura das polícias, por exemplo. Ou (acho mais difícil), poderíamos ter posturas mais ousadas nos editoriais, como a defesa da descriminalização ou mesmo legalização das drogas.

Podemos ir além de Quetelet.



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