SOBRE A CARTA DA ACIL
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SOBRE A CARTA DA ACIL


Quando meu sogro morreu de câncer, fiquei um bom tempo sem conseguir pronunciar essa palavra e quando o fazia, a dor da perda de uma pessoa querida era sentida com a sua simples pronúncia. As palavras podem doer. Por isso imagino – e só consigo imaginar – a dor que familiares e amigos das vítimas da boate de Santa Maria (RS) estão sentindo, inclusive quando se pronunciam certas palavras. O trocadilho usado na carta assinada pelo presidente da Acil é infame e pueril e mostra a diferença entre o respeito de fato e a consternação da boca pra fora.

Defender fiscalização com hora marcada ou fora do horário de funcionamento real dos estabelecimentos, é defender que haja dois tipos de tratamentos aos cidadãos: aos mais fracos, que não possuem voz ou articulação, a parte do dura Lex; aos que tenham poder econômico, político ou social, uma fiscalização “pra inglês ver”. É a democracia do “sabe com quem está falando”.

Isso torna oco o uso de expressões “flerte com regimes totalitários”, na resposta da Acil, tão vazio quanto a defesa das “liberdades individuais” feita na nota infeliz que originou a crítica respondida agora. Para defender “liberdades individuais” é preciso que essas liberdades sejam iguais para todos. Enfim, é a velha tensão entre liberdade e igualdade, que nasce na Grécia e vem até os nossos dias, num delicado equilíbrio que só pode ser mantido se os discursos forem pra valer e não palavras jogadas ao vento. Quem é democrata da boca pra fora não consegue compreender isso. 

Construir um país moderno de fato passa por cortar na carne, por se despir do corporativismo e defender que a lei seja igual para todos e não que haja leis diferentes para segmentos sociais diferentes. Não é possível aplaudir ações policiais preventivas, com revistas em bairros pobres e se indignar quando elas chegam a bairros – ou boates – “nobres”. Não é possível superar a “viagem redonda” a que Raymundo Faoro se refere em “Os donos do poder” defendendo com uma mão que os políticos se desprendam dos interesses privados e com a outra defendendo privilégios. É preciso praticar o discurso. Senão, ficamos apenas lançando palavras ao vento.

Ainda que venha uma nova resposta, espero encerrar a polêmica por aqui. É preciso praticar o discurso. Senão tudo vira palavras soltas ao vento, esvaziadas de sentido.



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