Por Ana Camila
_Dentro da programação do Fronteiras do Pensamento, série de conferências com intelectuais de todo o mundo que acontece simultaneamente
_Ayaan, como se pode perceber, é polêmica. E em sua auto-biografia, Infiel, lançada em 2007, ela conta toda a história de sua vida, desde os cinco anos de idade até depois de ter praticamente sido obrigada a deixar a Holanda e se mudar pros Estados Unidos. A história de Ayaan é precisamente a história do que os ocidentais imaginam que seja a vida de toda e qualquer mulher da religião muçulmana – e Ayaan trabalha em cima disso. Sua trajetória não foi nada feliz, tampouco agradável, e ela nos conta isso com todos os detalhes, os detalhes que “todos querem ignorar”, como coloca a própria em determinado momento do seu relato.
_Em 500 páginas, o que se observa de Infiel é mais uma tentativa violenta de afronta à religião muçulmana que um relato honesto e ponderado. Para Ayaan, o islamismo é o mal de toda a humanidade, nenhuma mulher é feliz nem de longe e os homens são todos uns brutos e exploradores das mulheres (nos mais diversos sentidos). Com base nas suas experiências pessoais e na sua tentativa de resistir a um meio no qual nunca se sentiu em casa, Ayaan se dedica a demonizar a religião islâmica, e o faz com competência.
_Mas é difícil não observar o, muitas vezes, ingênuo posicionamento de Ayaan, principalmente considerando o seu óbvio deslumbramento ao chegar à Holanda, o “mundo ocidental e civilizado, onde as pessoas te respeitam pelo que você é”, como afirma a autora. O conflito “oriente x ocidente” a partir de Ayaan toma uma forma bastante infantil e maniqueísta, e em um dado momento fica complicado tomar partido de Ayaan, principalmente no capítulo em que ela relata como é maravilhoso viver num país ocidental, como tudo é lindo, como as pessoas são gentis, e até mesmo como o Deus deles é melhor!
_O problema de Infiel não é a sua tentativa de denunciar um fato que não precisa de denúncia no ocidente (público para o qual o livro está destinado), é a circunstância na qual a autora se encontra – livre das amarras religiosas, ela se sente livre como um pássaro, e apesar de clamar para si um senso crítico em relação à cultura muçulmana, não parece ter nenhum no que diz respeito à cultura ocidental (e não necessariamente cristã). Apesar de comovente, há uma grande dificuldade em comprar o relato de Ayaan como realidade, mas apenas como uma versão dela – e uma versão por demais temperada. Infiel é como aqueles filmes de terror que não somente insinuam a violência, mas a mostram
_Ayaan Hirsi Ali hoje vive sendo ameaçada de morte por “fanáticos religiosos”, que não aceitam o seu posicionamento crítico e por vezes ofensivo em relação à religião islâmica. A autora se dedica a dar entrevistas e conferências pelo mundo, para alertá-lo sobre a vida à qual as mulheres muçulmanas são sujeitadas em seus países de origem. Segundo Ayaan, o ocidente tem que interferir nos países muçulmanos, impedir que as mulheres sejam tratadas como animais. Países como a Holanda têm que acabar com essa história de abrir colégios muçulmanos para os filhos das mulheres refugiadas, porque há de haver essa mescla, esse intercâmbio cultural entre crianças cristãs e muçulmanas. Para Ayaan, que hoje em dia se proclama atéia, a única razão de assumir essa vida agora arriscada é alertar o mundo da situação da mulher muçulmana.
_Principalmente após a morte do cineasta Theo Van Gogh, assassinado por homens muçulmanos em razão do filme “Submission”, dirigido por Theo e roteirizado por Ayaan, a autora tem ido a todas as redes de televisão de diversos países, pegar o gancho da tragédia para falar sobre a questão da mulher. “Submission” é uma provocação de Ayaan, um curta de dez minutos no qual se vê uma mulher muçulmana falando de sua vida, como é tratada por seu pai e outros membros da família, mas em um texto irônico e imagens sensuais do corpo dessa mulher. O vídeo seria o primeiro de três, mas com o assassinato de Theo o projeto teve fim.
Assista ao vídeo “Submission”:
_Vivendo cheia de guarda-costas por onde quer que vá, Ayaan continua sua luta em favor dos direitos das mulheres da sua ex-religião. Onde quer que vá recebe aplausos (dos ocidentais, claro), mas, em meio a tanta polêmica em suas declarações, vez ou outra alguém decide colocá-la contra a parede e contestar suas afirmações acerca da situação da mulher islâmica, dos países muçulmanos e do seu lugar de fala, sendo uma “ex-muçulmana” e atéia. Como no vídeo que segue abaixo:
http://youtube.com/watch?v=vg8AYs56RAY